domingo, 24 de outubro de 2010

"Mas há a vida
que é para ser
intensamente vivida,
há o amor.
Que tem que ser vivido
até a última gota.
Sem nenhum medo.
Não mata."

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sábado, 23 de outubro de 2010

O único que me incomoda
é esse vazio
sem fim
nunca acaba
nunca cessa
nunca me deixa em paz
e me atormenta

caco de vidro
lamina
sujeira
amor
amo-o, alimento-o, adoro-o
mas espanto-o como jamais

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Eu pensei demais
E perdi o sentido
Agora me trás de volta
trás de volta e volta pra mim

trás o sentido e chega logo o fim.

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"Sobrou só esse nó no peito, agora faço o quê?"

Ultimamente até as coisas tolas do dia a dia andam me prendendo. E várias coisas me atormentando. Fui confessar dia desses, obrigado, mas fui; o padre falou mais que eu, e eu só tive a chance de dizer dois estorvos meus. A comida, e a família. Não me sinto preocupado em comer, me sinto incomodado comigo mesmo. Meu corpo. Não minha alimentação e muito menos o meu colesterol e tudo mais. Pra minha idade, ser precoce ás vezes acarreta algumas preocupações para meus pais. Entendo, até. Mas não compreendo tanto minha mãe. Essa semana tivemos sérios atritos, gritamos bastante um com o outro e eu sinto que, deveria ter gritado mais. Me sinto fadigado, preso, sinto TANTA coisa boa e ruim dentro de mim, e sinto tanta vontade de expôr esses meus devaneios matinais, diários, e noturnos. E acho que quando eu me libertar, eu vou ser alguém mais comprenssivo.

Mas para me libertar, não vejo soluções, preciso ferir pessoas. Preciso gritar, chorar, me perder, e me achar de novo. Viajar, ser menos preguiçoso, ver gosto nas coisas de novo. Me diga, o que adianta viver, e não achar sentido em nada? Lamento ver que cheguei num ponto que nem eu mesmo via o caminho. Ando frio; "chorar, choro ás vezes, e é tão frequente". Sinto vontade de trabalhar, estudar, e me dedicar, sair pelo portão da frente de casa e não preocupar em estampar a cara aos outros. Sem dinamismo, sem mistérios, sem caras fechadas e mau-humor. Tento, ligo pra uma amiga da escola que também sente necessidade de se achar, mas sei que não é tão desesperadora quanto á minha, e começo a dizer: "Oi, tudo bem? Olha, eu to te ligando pra dizer que nesse momento eu to chorando por uma coisa que eu não sei, mas essa coisa não tem remédio e ela lateja dentro de mim como um caco de vidro no pé. E dói, dói tanto! Você pode me ajudar? Quero estar feliz sem estar triste, e estar triste estando feliz. Pode ocorrer? Há algum zero oitocentos que me socorra? Igreja, talvez? O que você acha? Não tenho tanta fé. Não posso me colocar dentro de alguma religião que meus olhos latejam. Meu coração grita, minhas mãos querem briga. Meus pés procuram caminhos mas meus olhos não os deixam sair de onde estão. A terra gira gira gira o tempo todo e eu me quero de novo. Mas... Quando foi que eu me tive?". Não, é óbvio que não saiu apenas um "Depois eu te ligo" e mais nada. Não funciona. Não comigo. Não agora. Mas quando? Quando é que tudo acaba ou quando é que eu vou aprender? Talvez nunca. Não com esta forma de viver.

Talvez eu precise de um impulso. Mas não adianta, nada: Mamãe vive me obrigando a comer o que o nutricionista diz, e eu não concordo. Não estou doente nem estou perto de ficar. Eu não consigo olhar pra papai sem ver quinze anos nas costas e de pura incapacidade de perdoar e afundar mágoas. Não consigo. A família almoça, as tias e a avó chegam e todo mundo come. Aparentemente felizes, e vejo que não sabem fingir direito. Não há ninguém feliz e nenhuma família feliz. Muito pelo contrário. Pelo menos comigo, não, não está tudo bem. Não tenho silêncio, não tenho nada além de uma migalha de esperança que me resta, e ela oscila como jamais oscilava. Penso que não sou forte o bastante pra conviver, e que sou dramático demais pra ir em frente, mas não sou e não é assim. Pra mim, esse vazio é excessivo é extenso, e por eu não conseguir explicá-lo, ele se torna mais vazio e mais louco do que parece.

Eu queria sair por aquela porta e horas depois receber telefonemas dizendo que sentiram minha falta. Eu ás vezes desejo que algo devastador aconteça para aí sim ter razão pra sofrer. Eu queria ter a mínima responsabilidade de ter um canto meu e que nesse canto eu não dependesse de ninguém. O que mais escuto são claro, vozes de gente, mas dizendo sempre que a gente precisa do próximo. Eu sei, sei que preciso, sei que é necessário ter amigos e sentir amor. Amor eu sinto, eu acho, mas é algo que ainda está amadurecendo dentro de mim mas eu me sinto feliz em senti-lo. Sinto feliz por ouvir que sou a esperança de alguém mesmo sabendo que não me resta tanta. Vou encontrá-lo e esqueço por alguns segundos que tenho um caco de vidro que não solta do meu pé, e a dor cessa, e ele me abraça, e esbarra o nariz nos meus e diz que me ama, ficamos nus por um tempo, relembrando atentados á nós e eu me calo, não por ele, não por ninguém, nem por mim. Mas não sou prepotente ao ponto de achar digno ocupar o tempo de alguém aclamando motivos vazios e sóbrios que me fazem sofrer.

Por mais que seja difícil e pareça complicado pra mim, vou sonhar com alguém consertando minhas asas caídas, que estão me impedindo de levantar voo; acho que algum gancho está me puxando pra dentro, você vê? Me ajude á tirá-lo de perto de mim, me ajude a me libertar, todos somos anjos, inclusive eu, por favor por favor por favor, estão me impedindo de voar. 

Mas sabe, quando a gente menos espera, quando a tempestade do dia já passou, me resta uma enorme paz. Esperança renovada. Isso que eu sinto agora. Não preciso de ninguém para tirar este gancho de mim, eu mesmo o tiro. E por hora, consegui. Só não posso aterrissar de novo - e sabemos que isso vai acontecer - e como o que eu mesmo me cabi, vou me soltar sozinho, de novo e de novo. Preciso me sentir mantido. Os problemas fora da cabeça, e dando a mão pra sorte. Bem abstrata, mas dou a mão pra ela. Vocês estão vendo como somos tão amigos? Ela também é sua amiga, inclusive. Está te dando um Oi e batendo na sua porta, qualquer dia desses.

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Tenho a impressão de que deixei todos os que andavam "do meu lado" partirem. Partirem sem o menor esforço. E a expressão "do meu lado" não se encaixa em absolutamente nenhum de meus partidos amigos já feitos, penso que deixei boas lembranças, alguns espinhos, mas boas lembranças. Não foi só companhia, foi ciúme, choros, apertos de mãos e abraços, laços desfeitos e consertados. Falta de imaginação, talvez. Tenho tido pesadelos terríveis, dolorosos - e de doloroso já me basta viver. É difícil, eu digo que é difícil sem nenhuma compreenssão de alguém, eu sei, mas é tão difícil quando não se vê mais prazer em nada.

Espero sinceramente que você se encontre de novo. É complicado viver em um mundo perdido, meu caro. Empurre imediatamente esse seu peito pra fora, e se sinta forte. Não há luz vindo da janela, agora, mas mais tarde terá. Não há nada além de café na madrugada, mas pode haver uma plantação inteira no teu terreno, caso queira.  Levanta, levanta logo, se levanta pelo amor de Deus! Você é forte, é lindo, é amado, por mim, e eu não quero sustentar dois. Largo minha dor pelos cantos quando estou do seu lado, assim, fácil. É só estar do seu lado que ela oscila. Acende e apaga. E quando ela apaga eu presto tanta atenção em você que me vem tanta confidência própria de ter só nós dois ali juntos pensando no amanhã ardiloso e ardente, e tudo foge, o poço já não existe mais. Só a plantação de café e a luz que vem das janelas. Pegue os remos e reme de novo,  não se sinta fraco, forte todos somos, viver é a prova disto.

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Eu juro, o que eu mais queria era compreender esta dor que lateja sempre. Previsível, nunca muda, nada adianta... Só dói, entende? E dói muito.

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Ando tão fadigada de coisas insuportáveis ao meu ver mas que são tão suportáveis ao ver de outros e ando tão fadigada de coisas inúteis que me sinto uma completa inútil fadigada.


Necessito consertar minhas asas. Urgentemente.

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Será que é você ou eu que não deixa? - ou nós -.

Me sinto inútil quando percebo que minha capacidade em afundar mágoas e perdoar você não me ocorrem nunca.

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Tudo tem dois lados. Incrível. Isto foi bom de se acontecer, por um dos lados. Eu estava contente e confiante demais. Pés no último andar e cabeça já ganhando asas. Você entende? Compreendo que aconteceu isso. Eu precisava colocar meus pés no chão.  Mas, não deixe virar um pesadelo completo, por favor, lhe peço.

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Deixo o espaço livre pra qualquer coisa entrar e sair - mas o espaço é pequeno, entendam. Muitos não conseguem vê-lo -. Meu amor por você rompe barreiras. Mas eu ainda estou aqui. Com as minhas. Você vê? Não tem limite. A chegada é a mesma, o meio é longo, e o fim, esse não chega nunca, meu bem.

Meus olhos estavam embaçados desde ontem, deitei na cama ao lado da janela e fiquei espiando a paisagem suja. Entretanto, meu quieto estado foi perturbado por um som de cigarra repugnante. Latejava em meus ouvidos e minha cabeça girava e meus olhos ardiam com a falsa luz. A quarta montanha queimava por trás das cortinas. Era tudo - ou quase tudo -. Só sei que era escuro e gelado.

Depois de alguns minutos, uma vetra de luz bem pequena surgiu entre a cortina e a janela. Era uma luz vermelha-amarela. Não se podia comparar á alguma luz clara ou branca, que seja. Era uma luz ardente. Tinha seu valor, poderia ser um início de caminho. Mesmo que fosse ardente. Era luz. Começo... Ou fim.

Começava a ventar, a brisa atravessava as cortinas e veio ao meu encontro. Apaguei as lâmpadas. Agora tudo estava escuro, fechado e silencioso, até que aquele estorvo, que chamamos de "luz" voltou. Pensei em porque você não me deixa em paz, e ela dizia que hoje, logo hoje, primeiro dia de primavera, ela precisava estar ali. Pra surgirem coisas novas, talvez. O desabroche de algumas coisas, podia ser. E dizia que tanto fazia se o que vinha de mim era verdadeiro, e que o mundo me enlouquecia de uma forma bruta, tanto fazia! E a morte, podemos assim chamá-la, não iria me aliviar; descanso, não iria me ouvir. Eu gritava alto mas ela tampava os ouvidos. Eu arregaçava as mangas e estava pronta para atacá-la, mas ela fugia, dizendo que eu ainda tenho muito o que fazer. E que NADA iria aliviar esta parte. Disse então, pra eu finalmente arregaçar as mangas pro que foi, e que eu não deixei ainda partir, e que isso doía, ardia por culpa minha. Me ordenou que olhasse pros lados, e percebesse presentes de primavera. Orquídeas, girassóis. Nessa manhã de primavera, surgiram duas flores na Orquídea de minha mãe, capaz de salvar ambições.Por que eu tinha de viver? O que é que você tanto guarda pra mim?

Se eu pudesse, jogava fora os piões nojentos, as avós ambiciosas, jogava fora políticos podres, gente falsa e burra. Antes valia a prostituição. Deixava os anjos e as drogas para infelizes. Mas gente não se joga fora. Não é como lixo - mesmo que alguns me façam desmentir esta fala - mas não se joga. De gente, se abraça e cuida.

Me disseram uma vez, que gente excessiva demais não tem remédio. Falam demais, beijam demais, se jogam demais, aparecem e querem demais; mentem por demasiado. Em outra vez, vi num metade sonho metade sonho real, uma garota de sete pés e sete dedos. Ia crescendo a medida que ela fazia algo "demais". Se multiplicava. Um monstro. A menina, apavorada, gritava e chorava. Pedia pelo pequeno, e queria isolar o demais. De tanto querer isolá-lo, cada vez mais o chamava. Tadinha. Não paravam de crescer dedos, unhas grandes, estrias nos pés.

No outro dia, a quarta montanha queimava de novo, sem nada fazer.

A luz apagava, voltava, apagava e voltava, apagava e voltava e assim por diante. Aquela reprise sem nenhum ideal, aquele inferno, só piorava minha constante insônia, e eu já estava me cansado deste fogo. Percebi que eu já estava acostumada com o acender e apagar das coisas. Me incomodava, obviamente, mas não fazia nada. Poderia dizer que era uma caixa fechada, isolada no meio de todo mundo que por ali passava, uma caixa no meio da estrada, mas a caixa, aquela caixinha ali, pequena, coitada, só se abria pra quem ela mesma quisesse.

Talvez meu pessimismo atinja camadas boas na minha vida. E em diante passaram a ficar ruins. Mas veja só, meu querido, existem camadas em mim que NUNCA mudam. Apesar de minha infelicidade continua comigo mesma, me pego de vez em quando sorrindo como nunca, leve, indiferente á qualquer dor que a senhora solidão possa me afligir. Observe como camadas em mim nunca mudam, tenho provas, sérias provas! Tenho a R., que devolve minha infância. O C., que considero meu cordão umbilical, pois me liga á ele e me conecta com o outro lado, me vive. Me faz amar. O único que tenho mais certeza que nunca quero perder. Me conforta, se é que me entendem. A F. Ah, a F, já me causou muitas dores, machucados que nunca parecem se transformar em leves cicatrizes. A S., tem um espaço em mim, que nada nem ninguém jamais tira. Mesmo se um dia, ela vir á querer.

Entendi finalmente que aquela luz, que se mudava em uma sequência só, se repetia porque EU queria. Porque acostumei. No fim da noite, fiquei pemsando e imaginando e criando uma luz clara, porém nem branca nem amarela, muito menos ardente. Não importava a cor, era o bastante pra acender algo já apagado em mim.

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bon vent à toi

- Mas você tinha prometido.
- Prometi e agora DesPrometo. Algum problema quanto á isso? Sabemos que muitas coisas ocorrem assim. Me deixa, e, procura algo de melhor pra você.
Olhava nos olhos dela como um cão sem dono, um cão amargurado que sentia-se sem nome e identidade. Vira-lata. Cadê meu osso?
Procurei fazer acupuntura, natação, academia, voltei a comer. Você me abriu o apetite e limpou meu apartamento de coisas runs e incensos queimados; me ensinou a pular corda e brincar de amarelinha. Me fez rever minha família que eu não via há muito tempo. Me fez voltar ao céu.
E agora, é quem corta minhas asas.
- Pega conselhos. Seus anjos parecem tão afagados.
Nessa hora, levantei da cadeira e minhas asas se soltaram. Aos que viram, pensavam que fosse Gabriel, ou talvez Querubins, Serafins, Tronos ou Ofanins, ou mesmo pura ilusão. Asas implantadas, poderia ser. Mas não era. Me sentia apenas como um homem que se sentiu amado e voou.
Me bateu sincera dor no peito e nos ombros, coluna vertebral, nuca e braços. Você me reviveu e agora quer que eu me livre deste... fardo. Como apenas eu fosse o responsável. Não é assim, querida. Mesmo com o nosso infeliz e acumulado amor, não irá tirar além de minha alegria; não irá me dar a insatisfação de perder a incapacidade de voar. Porque sim. Não podemos ficar á ponto da morte quando uma falsa possibilidade de amor vai embora. Por mais que doe, deixe essa dor quieta. Ás vezes ela vai embora, ás vezes, não. Uma hora, outra aparece. Outras vezes, não.
Talvez, pensei em encontrar em outra esquina, uma possibilidade ou salvação de vida. Mas não queria pensar no depois. Só na leveza de existir e o peso de perder alguém de forma cruel.

Pulei contra o vidro, e voei. Sem rumo.

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Haviam apenas três alternativas: fugir, sair, e ficar. Pensei horas e horas e avaliei ainda mais as consequências. Sei que é errado, mas sei também que quanto mais a gente pensa, menos sentido as coisas fazem.
Não tenho vontade de sorrir. Tenho asco e impaciência nos olhos. Depende do dia. Disseram no jornal que ontem iria chover. Fez sol. Nem o tempo climático obedece aos aperfeiçoamentos que lhe cabem. Se locomove sozinho. Queria poder fazer o mesmo; mas algo - deve-se chamar de vida - me manda bruscamente para lados diferentes há cada segundo. Quero um engarrafamento, onde minha cabeça pare de funcionar um pouco e eu precise exijir de mim mesma atenção e concentração numa coisa que não será eterna. Quero me mover, mas quando eu bem entender.
Porém, acho que troco e sou feita de fases e me mudo mais que a lua. Minha única certeza é meu coração. Eu mudo, e ele ama sempre as mesmas coisas. Fico feliz por ser destruída, mas não destruir á quem verdadeiramente amo. Minha ordem é crescente e decrescente, sempre divido minhas escuridões e clarezas em dias. Os dois sempre se misturam. Entretanto, vivo no mesmo ciclo há anos.
Hoje é nublado, parece haver uma neblina muito forte no céu, mas beem lá no alto. Branco. Pálido. Á esquerda, via-se o azul escuro, forte. Sem nuvens, sem cores demais, sem acasos, devo estar opaca como ele.
Meu pai tem em mente que eu seja esfomeada da vida, porque comida que tem que comer, ele diz que eu não como. Proteína.
Meu alimento é minha própria fome.

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O galo não cantou, e nem ela, nunca mais

Então se lembra repentinamente do rosto de cada um, do lugar; falhava-lhe a memória, mas lidava e entendia muito bem a troca de cenas. Uma pessoa no parque, duas num bar do centro de Copacabana. Ou seria Niterói? Não se lembrava tanto, pois, se confundia; só sabia que eram duas pessoas recém conhecidas.

Conhecidos ali mesmo, deviam ser onze da noite, Pablo com trinta e ela com quarenta e um. Ambos afogavam estorvos no copo de pinga que ali se apresentava. Pablo era da cidade. Ela, do interior. Super-rural. Sentia-se e cumprimentava os outros e observava a todos com um jeito tão superior que quem visse jamais suspeitava de onde viviam seus aposentos. Era mãe de quatro filhos e casada, marido fazendeiro, já doente, de cama; mal sabia ela que, naquela noite, começaria uma vida nova, um lucrativo e importante resultado, um filho.

O assunto acabara e o tempo também. Olhava ela ao relógio do pulso, calculando em que horas o galo cantaria. Saíram do bar abraçados, escorados um ao outro, cantando repetidamente "Sangue Latino" e imitavam o gingado totalmente inconfundível de Ney Matogrosso. Se apreciavam, tanta complacência pra uma noite só, se olhavam felizes por serem completos infelizes. Àquele ponto não mediam passos. Só se ouvia o salto de seu sapato e o coça-coça ensurdecedor e irritante da barba anos mil oitocentos e dez de Pablo.

Sentaram-se na areia úmida da praia, encostando em si pêlos, ossos, rosto, olho: beijos e abraços. Mãos. Pés. Unidos. Olhares, sorrisos e prazer. No meio de tudo, ela, tão ríspida e convencidamente vulnerável a qualquer toque se deixa levar por um simples caboclo que mal conhecia e só pensava em adultério, em erros, em culpa, em seus filhos - quatro, como podiam? - e no galo. Mas não, aquele jovem não queria nada além de uma aventura de noite e sem valor algum, imprestável ao ponto de não servir nem pra contar vantagem e trazê-lo satisfação.
- Estou passada. Chega de passar. Disse ela lúdica, porém lúcida a ponto de saber o que estava fazendo e lúdica dizendo abobrinhas que lhe compreendessem porque meu-marido-está-doente-e-morrendo-e-eu-não-quero-morrer-junto-dele-mas-não-se-há-nada-a-fazer-e-bla-bla-bla.
Então se lembra repentinamente do rosto de cada um, do lugar; falhava-lhe a memória, mas lidava e entendia muito bem a troca de cenas. Uma pessoa no parque, duas num bar do centro de Copacabana. Ou seria Niterói? Não se lembrava tanto, pois, se confundia; só sabia que eram duas pessoas recém conhecidas.

Conhecidos ali mesmo, deviam ser onze da noite, Pablo com trinta e ela com quarenta e um. Ambos afogavam estorvos no copo de pinga que ali se apresentava. Pablo era da cidade. Ela, do interior. Super-rural. Sentia-se e cumprimentava os outros e observava a todos com um jeito tão superior que quem visse jamais suspeitava de onde viviam seus aposentos. Era mãe de quatro filhos e casada, marido fazendeiro, já doente, de cama; mal sabia ela que, naquela noite, começaria uma vida nova, um lucrativo e importante resultado, um filho.

O assunto acabara e o tempo também. Olhava ela ao relógio do pulso, calculando em que horas o galo cantaria. Saíram do bar abraçados, escorados um ao outro, cantando repetidamente "Sangue Latino" e imitavam o gingado totalmente inconfundível de Ney Matogrosso. Se apreciavam, tanta complacência pra uma noite só, se olhavam felizes por serem completos infelizes. Àquele ponto não mediam passos. Só se ouvia o salto de seu sapato e o coça-coça ensurdecedor e irritante da barba anos mil oitocentos e dez de Pablo.

Sentaram-se na areia úmida da praia, encostando em si pêlos, ossos, rosto, olho: beijos e abraços. Mãos. Pés. Unidos. Olhares, sorrisos e prazer. No meio de tudo, ela, tão ríspida e convencidamente vulnerável a qualquer toque se deixa levar por um simples caboclo que mal conhecia e só pensava em adultério, em erros, em culpa, em seus filhos - quatro, como podiam? - e no galo. Mas não, aquele jovem não queria nada além de uma aventura de noite e sem valor algum, imprestável ao ponto de não servir nem pra contar vantagem e trazê-lo satisfação.
- Estou passada. Chega de passar. Disse ela lúdica, porém lúcida a ponto de saber o que estava fazendo e lúdica dizendo abobrinhas que lhe compreendessem porque meu-marido-está-doente-e-morrendo-e-eu-não-quero-morrer-junto-dele-mas-não-se-há-nada-a-fazer-e-bla-bla-bla.

O galo não cantou, minha senhora. Como conseguiu entrar em casa sem que seu marido lhe visse? Mas, viram você segurando o galo no colo e o apertando a boca. Sem arranhões? Marcas? Não pense isso. Ouvi também o copo de barro que eu tanto gosto e que estava na beirada da mesa, vi os arranhões no copo, e vi também suas marcas dos pés no chão. Porém, o que me incomodava não era tua presença, e sim a sujeira que você deixava por onde passava; sombras, manchas pretas, escuras, opacas. Sentia o hálito da culpa por longe. Mas leve este copo, senhora, eu o contemplava com estes meus olhos cinza esverdeados e esta minha penumbra marrom e branca a lembra de algo? Que bom que não. Renegue até o fim. Remédio ou nem macumba ou o "olhar de Oxum" sobre você irá mudar quaisquer que sejam seus fins.

Você o esnobou de lonjura ambígua demais. Precisava ter chegado mais perto. - Esfrega-me nesta cara a traição que me fizestes. Você nada mais é do que mais uma insaciável neste mundo. A coruja agora indagava: Mas, acredita, viu? Qualquer dia qualquer coisa muda. Leva-me com você. Só fico acordada de noite e o maior barulho que faço são meus urros. Sem coçadas. Começaremos de novo. Acredita. Eu, você, sua filha - que anda mexendo como nunca, desassossegada como a mãe.
Seu marido queria sair da cozinha, mas ela não o deixava; pedia perdão e revelava seus anseios, vergonhosos, pesados. Mas comuns.
- Não... Eu acho que eu sei. Sei que nem tudo tá no devido lugar. Mas eu procuro, procuro aqui, ali, no meio, no final, no início; mas não acho. Nunca acho nada. Eu procuro meu próprio erro, o início onde tudo começou e não acho. Sinto-me num labirinto onde me procuro sozinha. Não posso dizer pro próximo o que eu sinto. Não quero mistério. Mas necessito dele pois, não consigo nunca dizer o que sinto. Nunca me divirto sem pensar no depois. Depois disso aqui, depois que a tristeza chegar, depois vai vir a insônia, depois eu vou ficar chata, depois eu não vou querer ver você, depois eu não quero ir pra casa, depois me leve pra algum lugar. Bem perto. Bem perto, entre mim e você.

As nuvens já se passavam no vasto céu, nada mais ia consigo á não ser sua certa fé que lhe restava. Cactos na estrada. Faltava água. "Oh, meu pai, será que há de demorar muito? Nada tenho em mim há não ser o peso da falta que ele me faz e esta coruja em meus braços. Tirai-me de mim o quê mais além da filha que não vou mais parir?"

O sol escaldante deixava com sua eterna luz a dificuldade de enxergar, mas se via, por alto, subindo os morros, repleto de decisão e mágoa, a veracidade de um homem que dava chicotadas nos cavalos com quem quer se salvar do mundo todo, a pressa em salvar a mesma menina sozinha num dia ensolarado e de pássaros sem canto, diante de todos num parque; isolada num canto, a mesma mulher que traiu o amado marido doente: cego de amor, pronto para salvá-la.

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Sonhos são

Desta vez foi diferente. Parecia ser um quarto ou uma sala, um cômodo bem pequeno. As paredes eram brancas mas uma pintura velha, um pouco não-apresentável mas que era aceita. Havia um travesseiro, um cobertor de tecido liso mas que parecia pesado; esquentava. Bastava ser assim. Acho que você apareceu em outro lugar. Mas apareceu. Não me lembro como, só lembro de te ver me puxando e socrorrendo pra algum lugar. Mas no cômodo que eu estava, o colchão era junto da parte, e do chão também. Sem porta. O azulejo era branco, limpo; mas o mais barato. Coloquei a cabeça sobre o lençol e minha cabeça adormeceu e meus olhos se fecharam. Mesmo desacordada meu inferno interno ainda não parava de fazer chamas. Pensei nela. No depois dela. Aquela pobre mocinha, teria um depois? Penso que sim. Mas um depois penoso, degradado e desagradável. Casada, talvez. Ou mãe solteira. Não estou jogando palavras fora. Penso que realmente seria assim, caso ela não entrasse nos eixos. Não é bom ver alguém se destruindo aos poucos e estar metade-feliz. Mesmo desacordada, parei de pensar nisso e tive a sensação de ter adormecido de verdade. Limpa. Graças a Deus. Agora não pensava em nada.. Uma borracha passou por cima de mim. Sentia. Quase invisível, não sentia o material. Só sentia que sonhava.
Só tive sonambulismo uma vez. Aos sete ou oito ou nove anos. Lembro exatamente como foi, minha mãe me contara. Mas é engraçado e vergonhoso, convencível o bastante para contar outrora. De repente vi uma coisa preta entre a porta do armário e a outra; um Louva-a-Deus. De cor um pouco extinta. Normalmente eles são amarronzados ou verdes, lembrando mais grilo. Ok. Tinha certeza do que era, agora que, mesmo dormindo, sentia que via limpamente um bicho de pernas longas pronto pra vir ao meu lado. Acabei ficando inquieta e imóvel; apaguei de novo. O Louva-a-Deus continuava ali, olhando pra e estando no mesmo lugar. Estranho. Deviam ter se passado duas horas o três. E a merda do bicho ali. Olhando pra mim. "Será que ele me louvava?" Parecia indiferente. Olhei do lado do armário e vi uma lagarta; preta, também. Pensei nele.Gostava de sustos quando estava com ele. Eu ficava mais lúcida do que lúdica. Fechava os olhos; me desconcentrava de tudo. Consegui. Finalmente. Mas dobro as sombrancelhas e tudo fica real de novo. Tenho esse mal. Não me concentro nas coisas. Não sei me desligar muito bem. Sempre algum fio fica ali, funcionando. Minha máquina pensativa não para nem quando eu mando. Não me obedece.
Voltei.A lagarta se movia como um caracol. Soltava um certo líquido ascoso. Dessa vez demorei mais a dormir; quando adormeci, senti vertigens, meu corpo se mechia e meus olhos rodavam. Meus braços tremiam e eu me sentia no topo de um penhasco. Acordei. Os olhos se abriram numa velocidade que eu não entendi muito bem. Arregalados. Prontos pra dar o bote numa cobra qualquer. Se sentiam fortes. A lagarta estava no chão e procurava algum beco que substituisse a porta. Mas não se iluda, lagartinha. Não há como sair desse sanatório. Só há um ar-condicionado na parede baixa e sempre sequestrava e nunca devolvia alguns fios de cabelo meu. Quis pegar ela e colocar num buraquinho entre a parede do lado esquerdo e a de trás, mas peguei o sono enquanto pensava. Acordei sentindo calafrios e quando vi, avistei no cobertor escorpiões e camarões. Grandes. Vinham até mim enquanto meu medo e terror aumentavam. Como eu saio daqui? Rodei os olhos e quando os olhei ali não estavam mais. Sumiram. Deitei afobada e me apoiei. Senti o travesseiro mais duro e apertei com a cabeça. Pois bem. Saíram todos de lá, mais agéis e mais rápidos. Espertos, se camuflaram no travesseiro. Saí. Não se tinha canto em que eles não estavam. Em minha volta. Todos. Sobindo em minhas pernas e pés. Braços e cabelos. Ombros.

Alguém batia na parede. Acordei.

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Passado Presente

Ela possuia um olhar baixo, angústia, talvez; mesmo desconhecidos desde já entendiam, porque tanta magreza, tanta branco, tanta falta de cor, quase sem recheio. Que garota opaca. Antes a mãe dela que torrasse a mão em suas bochechas, assim pelo menos ficariam coradas. Dentro dela existia uma ausência imersa; alguma coisa irremediável; ás vezes irritava, ás vezes se acostumava, ás vezes ardia, imerecido, imigrado.
Certa vez voltando do trabalho, de pé, pensava; cores, certas cores. Azul, preto, cinza, rosa, verde, amarelo, branco, vermelho. Imaginava, cavalos brancos, Unicórnios, Bretões, Crioulos, Pasos, Árabes. Céu azul, ou céu avermelhado, nublado, amarelado, sol se pondo, pôr-do-sol, ali se estava. Imaginava árvores grandes, ávores de tronco largo, fortes e grossos, raízes em destaque, folhas caídas dando ao ver o outono, folhas verdes, riscadas, formando símbolos. Natal. Não deixava virar um manicomio geral. Imaginação pode tudo; mas isso ela não queria. Não queria que o real necessário se transformasse também em imaginação. Perdia o sentido frequentemente. Lembrou por leve de um relacionamento unilateral, lembrou tão de leve que se assustou com a buzina de um carro, fusca. Velho. Se assustou e retomou sua reta. A perda de alguém tão próximo e ao mesmo tão distante feria. Sua pele descuidada, as unhas desfeitas, mas limpas, higiênicas. A roupa comportada; se movia com pernas tão suaves que quem abaixasse os olhos e percebesse a voracidade dos pés, de quem tinha o dever de dar mil marchadadas numa formiga só, a julgaria como alguém altamente excêntrica ou uma louca como comum se pelos lados.

Mas não, não era assim,
E pra nós, pra mim, pra ela,
não havia de ser assim.

Voltou a si. Perdia o sentido frequentemente. Pensou em como lembranças tinham o potencial de fazê-la sentir camuflada. Não intencionado. Acontecia. Passou numa rua deserta mas suas habitações que nela estavam se percebia de certa distância e se ouvia barulho. Passara por um salão, apartamentos, lojas de luxo, uma floricultura e uma perfumaria. Num beco, no final da rua, se via tráfego. Tanta gente amontoada e suja e suada que retornou e seguiu outra via. Bandas desconhecidas, se perdeu. Agora sim, precisava se camuflar. Passou pela floricultura e imaginou-se dentro de um travesseiro de flores, rosas, margaridas, girassóis, gramídeas, margaridas. Sem flores comestíveis. Sem abelhas procurando pólen, não há nada nelas nem muito menos em mim. Espanto-lhes. - Chega. Vou sair daqui.
Chegou em casa. Primeira coisa vista, sua mãe, deitada de bruços no sofá. De lado, uma garrafa de vinho. Doce. Vazia. Com a pouca força que o dia a tomara, levou sua mãe ao dormitório e do seu lado sentou. Rodou novicentas e noventa e nove milhões de vezes, porque tudo haveria de ter que ser assim. Sua fé não era lá tão grande, mal podia se permitir em crer em algum Deus, pra ela tudo se fazia de sorte, e as pessoas só o usavam como anestésico. Entretando ela se pegava sonhando e acreditando, sim, tinha esperança. A maré poderia ter a folga de existir a possibilidade de alguma coisa, ao menos, que a desse afago em abundância.
Sua irmã deu um toque na porta e disse que 'já cheguei' com tom de desdém, não viu sua mãe, estava tudo escuro, depois disse 'que escuridão, pra quê isso?' - Nada. Não é nada, saia daqui. - Em seguida sua irmã saiu e a deixou, ela olhava para a mãe com quem pedia perdão por sentir pena, asco, dó. Mas a amava. E como amava. Queria seu auxilio. Queria seu porto. Queria que ela se assumisse como uma fonte. Mas não, não assumia... De quê adiantava? - Opa, tenho que fazer a janta.
Se trocou mais pálida ainda e colocou o avental; seu pai chegou, inquieto, porém em silêncio. Se serviu da janta já requentada e começaram discurssões, não com ela - ela não fazia a mínima diferença e por isso ninguém a olhara, ninguém surpreendia-se com atitudes dela ou que fosse a desfeita, não se permitia dar desgosto. Só cumpria obrigações. Bastava.
A luz acabou. Olhou pro pai e pensou em como alguém poderia falar tantos palavrões e devaneios no mesmo segundo, que preparação. Continou olhando sem ser olhada e pensou - se preocupe quando eu coçar a cabeça e ficar sem piscar por três ou dois ou quatro segundos, aí sim, se preocupe -. A mãe ainda dormia; ouviram a porta bater e o portão ranger. Não haviam velas. "DIACHO!" Falava o pai.
Exatas três horas depois a luz voltou. Sua irmã voltara. Seu pai já havia dormido pois estava cansado da oficina e amanhã ás-se-te-ho-ras tinha igreja. Compromisso. Estava mais cansado ainda porque, sua filha, a outra, dara trabalho no dia. Nova, tão nova, e já dando trabalho, pensava. Se descobrisse que o cansaço foi em vão e que houve enganos jogados, haveria influências a serem contadas, influências falsas, certeza. O olhar de angústia da outra irmã pensava isso. E sabia que iria cair pra ela. Sabia. Mas sabia que as aparências enganavam, e que no caso dela, nem miséria aparência ela tinha. Que desgaste. Sua irmã chegou ás vinte e quatro horas e a viu sentada no sofá, começou o discurso. Afobada. Falava baixo. Você enganou seu pai direitinho, garota. Sair quando se apaga a luz é ótimo, a arruaça lá fora é o que todo mundo faz, não é?! Mas você não, foi mais espera e mais ágil, foi logo se esfregando no primeiro rosto-velho que você viu. Sim, rosto velho. Você não o conhece. Além de velho, é estranho. Como pode se esconder nos fundos da casa de um estranho? Viver é correr riscos; mas não esses. Você não pensou, foi logo com a cabeça fraca. Que bom. Você pensa. Que bom que aproveitei. Mas te pergunto como fica o depois, e você se diz imprestável com um sorriso de orelha á orelha, minha cara, isso não é vida. Depois, e o seu depois?! Não vou lhe dizer que ele não vai vir e você vai se arrepender de tudo, não. Ele virá. Mas, parece que pra você, enganar e mentir e se ferrar é só uma parte do pacote. Você chegou ao mundo chorando. TEVE que chorar. TEVE que chorar pra provar que estava viva e era normal. Chora agora. Chora! Você merece. Mas chorar não vai te fazer bem; você só vai perder um líquido do seu corpo e se, for diabética que nem sua mãe, sua compaixão vai se escorrer. Pra lá. Rio, mar, oceno a baixo. Não dizem que produzir baixa glicose, abaixar seu ritmo, baixa também sua cabeça. Não me dirijo á compaixão ao próximo, compaixão com si mesma. Perdão. Você vai ter que fazer isso. Terá. Não sou nenhuma evangélica mistificada e transtornada e totalmente cega, sou você e caminho com você. Desprezo. Desprezo economiza ódio, despreze. Então... Mas, não me deixe para trás - eu não queria você, pensava. eu queria ele.início dele. Metade dele. Todo ele -. Mas eu sei que você vai deixar. Você precisa me deixar. Mas se leve. Não se deixa pra trás e nem se quebre, porque coisas tão sensíveis demoram á ser repostas.

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Desculpa se hora eu fui feminista demais e outrora fui arrogante demais e nem olhei pra você. Desculpa por ser tão sem-graça e tão insegura. Desculpa por querer o mundo todo de uma vez só e ver que, não se pode ter o mundo todo. Desculpa por ser impaciente e apressada; é que eu preciso imaginar primeiro, depois tocar. Imaginar, que eu imagine errado, que seja fértil demais, ou que seja colorido ou preto ou apaco ou atée sozinho demais. Desculpa por ser repetitiva e acabar não sendo aleatória. Entenda, não sei me entregar á algo que eu não conheça. Não sei. Desculpa. Foi mal. Sorry. Sou culpada. Eu sei que sou. Mas, relaxa. A vida engana, né?! - mas engana tão bem que todos nós somos tão enganados e nos enganamos tanto que continuamos enganando o outro. Eu só queria, eu SÓ queria, que nada fosse assim. Tão enganável. Tão líquido. Tão areia. Tão "não dá e não passa"; me pego ás vezes tão cansada inconformada dilacerada mal-humorada chateada e apática com essas coisas que me aparecem e que parece que eu não as sei; não as compreendo. Mas compreendo tanto que me pego em meio á puro asco; de mim, de você. Mas eu sei. Eu compreendo. Parece que eu não sei mas eu juro á mim mesma que sei e repito que sei. Que amei. Que vou amar. Mas desculpa se eu escolhi você. É que eu te olho e te vejo e observo num vazio tão grande nos olhos que me vem medo de cair no teu abismo. Tão misterioso e claro.
Então você me salva e me abre um sorriso canto-a-boca e me aquieta e me acaricia dizendo que tá. Que vai ficar. Que vai ficar tudo bem.

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Tanto faz. Isso não é pra você.
Ou não tem que ser agora...

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Quem [re]verbalmente somamos

Dia desses no shopping vi casalzinho de franja cobrindo os olhos, meias listradas e cintinho igual; passaram de novo por mim, e de novo e de novo. Depois da terceira, comecei a desconfiar que não era o mesmo casal e ainda assim, de todos que passavam, eu nunca conseguia distinguir qual era o menino e qual era a menina (nem simplesmente se eram dois meninos ou duas meninas.). É um tempo das tribos. Dos emos, dos indies, dos cantores de axé.. (não, esses últimos são atemporais.) As pessoas se agrupam, compartilham o que pensam, o que vestem, músicas nos Ipods e, dizem, o que são. Nessa parte, sobre o que se é, tenho lá minhas dúvidas. E algumas certezas.

Não nos bastamos e penso ser difícil que um dia possamos ser auto-suficientes. É típico de ser gente isso de se juntar. E vai ver que é ai que mora o crescimento. Encontros, conversas, trocas. Não se troca muito quando se é igual. (Ou quando estamos satisfeitos com o que somos prontoacabou.)

E é provável que cada encontro nessa vida seja um aprendizado, uma experiência ou no mínimo uma mentira nova pra contar. Quem mede os quais se junta perde mais do que pode calcular. Professor, Doutor .. até que sabem de umas coisas, mas bêbado de fim de festa, idoso em ônibus e criança perdida já me ensinaram boas coisas que nem no Google dá pra achar.

Pessoa disse, e eu não ouso não reproduzir direito, que 'Regra é da vida que podemos, e devemos, aprender com toda a gente. Há coisas da seriedade da vida que podemos aprender com charlatães e bandidos, há filosofias que nos ministram os estúpidos, há lições de firmeza e de lei quem vêm no acaso e nos que são do acaso. Tudo está em tudo.' É fato que está. Não podemos supor que o que nos vale estará de fato na biblioteca, Tesouro da Juventude.. tem dias que o que nos falta está na turma da Mônica ou lá em Calvin e Haroldo!
Pegando um pedaço desse comentário, me lembrei dum dia que fui sair com um ex-amigo, e nos apareceu um homem de idade, tomando um certo caudo (parecia bom!), e estava nos contando sobre um show de farras que ele foi, superlotado, onde havia tribos de todos os tipos... rockeiros, emos, riquinhos... muita coisa mesmo. Nos contou sobre uma menina, linda, por sinal. Que de repente ficou bébada, ou drogada, ninguém sabe ao certo, e se vendeu, por preços baratos.
Pergunto-me, (num bar!) um senhor de cadeira de rodas, tatuado, com dentes implorando o "stop" pro cigarros, cor de sol, dizer seu ponto de vista, que por sinal era bem formado, me surpreendeu.
Mas bom, voltando...

Somos aquela velha, batida e muito verdadeira história da colcha de retalhos, e quem chega aos 25 achando que já está bem costurado deixa de achar muito tecido, textura e caimento (ui) novo por aí. Até o fim estamos aprendendo, afinal ainda que já tenhamos visto tudo no mundo (o que nem Dercy viu.) ele, e as pessoas que estão nele, tornam a mudar a cada dia, não é? Não desperdicemos os encontros, as pessoas e os novos 'nós' que ele podem nos trazer. Diremos com quem andamos e qual parte de nós eles fizeram.

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pra ver se cola

Solidão: palavra cavada no coração resignado e mudo, no compasso da desilusão.

Danço eu.
Dança você?

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a vida sabe dela

Tudo tem uma razão de ser. Isso, assim, bem clichê. Mas realmente, as coisas acontecem por motivos que só depois vamos entender. Por mais que no momento que aconteçam a gente se pergunte o porquê de ser assim, mais ali na frente vem a vida e nos mostra exatamente porque tinha de acontecer desse jeito e não daquele. E aí tudo se encaixa e a gente vê o que nosso inconsciente já sabia mas estava esperando a melhor hora pra revelar. E muitas vezes quando nos damos conta, a resposta era óbvia, e estava ali bem na nossa frente. O pior cego é aquele que não quer ver. Eu vejo, mesmo que as vezes tardiamente. Mas, antes tarde do que nunca...

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Breve Introdução do Ciclo Seco

Todo mundo conhece ciclo seco, a maioria até já passou por ele. Alguns mesmo vivem desde sempre dentro dele, achando que isso é vida e eternizando o que, por ser ciclo, deveria também ser transitório. É preciso acreditar que passa, embora quando dentro dele seja difícil e quase impossível acreditar não só nisso, mas em qualquer outra coisa. Não que ciclo seco não tenha fé, o que acontece é que não podendo ver o que não é visível, fica limitado ao real.
Antes de ir em frente, é importante dizer que ciclo seco nada tem a ver com as estações do ano. É coisa de dentro do humano, não de fora, e justamente por isso não tem nenhum método: vem quando não é esperado e vai quando não se suspeita. Ciclo seco não desaba de repente sobre alguém; chega aos poucos, insidioso, lento. Quando se percebe que se instalou, geralmente é tarde demais. Já está ali. É preciso atravessá-lo como a um deserto, quando se está no meio e a água acabou. Por ser limitado ao real, o ciclo seco jamais considera a possibilidade de um oásis ou de uma caravana passando. Secamente, apenas vai em frente.
Porque o real do ciclo seco são ações, não pensamentos nem imaginações. Tanto que, visto de fora, não é visível nem identificável. Não se confunde com “depressão”, quando você deixa de fazer o que devia, ou com «euforia”, quando você faz em excesso o que não devia. Em ciclo seco faz-se exatamente o que se deve ou não, desde escovar os dentes de manhã ou beber um uísque à tardinha, mas sem prazer. Nem desprazer: em ciclo seco apenas se age, sem adjetivos. A propósito, ciclo seco não admite adjetivos — seco é apenas a maneira inexata de chamá-lo para que, dando-lhe um nome, didaticamente se possa falar nele.
E deve-se falar dele? Quero supor entusiástico que sim, mas não tenho certeza se dar nome aos bois terá alguma serventia para o dono dos bois ou sequer para os próprios bois — e essa é uma reflexão típica de ciclo seco. Mas vamos dizer que sim, caso contrário paro de escrever já. E falando-se dele, diga-se ainda que ciclo seco não é bom nem mau, feio ou bonito, inteligente ou burro — nem a Alice, de Woody Allen, nem Bette Davis em algum filme antigo, nem o Homem Elefante nem um dos irmãos Baldwin, nem Gertrude Stein nem Romário —, embora possa dar uma impressão errada a quem o vê de fora, ávido por adjetivar.
Ciclo seco, por exemplo, não se interessa por nada. Pior que não ter o que dizer, ciclo seco não tem o que ouvir, compreende? Fica na mais completa indiferença seja ao terremoto no Japão ou à demissão de Vera Fischer. No plano pessoal, tanto faz ler ou não ler um livro, ir ou não ao cinema — ciclo seco é incapaz de se distrair, de se evadir. Fica voltado para dentro o tempo todo, atento a quê é um mistério, pois que pode um ciclo seco observar de si mesmo além da própria secura, se não há sequer temporais, ventanias, chuvaradas?
Nesse sentido, ciclo seco é forte, porque nada vindo de fora o abala, e imutável, porque de dentro nada vem que o modifique.
E nesse sentido também é antinatural, pois tudo se transforma e ele não, simulando o eterno em sua digamos, i-naba-la-bi-li-dade. E sendo assim, com alívio vou quase concluindo, pode se deduzir que.
Não, não se pode deduzir nada. Só que passa, por ser ciclo, e por ser da natureza dos ciclos passar. Até lá, recomenda-se fazer modestamente o que se tem a fazer com o máximo de disciplina e ordem, sem querer novidades. Chatíssimo bem sei. Mas ciclo seco é assim mesmo.

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